Friday, July 20, 2007

E que paragem, na quarta-feira à noite. O ambiente prometia, nunca tinha visto o Coliseu tão cheio, e posso vasculhar na minha memória, várias noites passadas, lá. O comentário inicial da Catarina, que nunca tinha visto tantas pessoas de aparelho, não era exactamente o que eu chamaria um bom sinal. Apesar disso, tenho que manter presente que esta é a idade dos rapazes que, passado pouco tempo, iam transformar a plateia do coliseu num mar de mãos, de cabeças, em êxtase, aos saltos.
Ao contrário do habitual, saí de casa a pé, e apanhei o metro para ir para o concerto. Com o iPod no bolso, a ouvir uma última vez o Whatever People Say I Am, That's What I Am Not. Não sei se o título do álbum pretende ser um acto de revolta, tão próprio da adolescência, é provável que seja, o estar contra por estar contra, mesmo que se saiba que não se tem razão. Para ser honesto, gosto de pensar que é uma maneira de dizer que as pessoas, sem nos conhecerem, inevitavelmente tiram conclusões sobre nós que não correspondem à realidade. E que é impossível não simplificarem, e que essa simplificação resulta, também ela invariavelmente, em percepções erradas. Agora, fiquei sem certeza disso, se é que alguma vez a tive. Porque parece tão simples. Porque não parece mais que um grupo de putos que se lembrou de começar a tocar sobre o que se passa à volta deles, sobre o dia-a-dia, sobre os problemas comuns que fazem a nossa vida, sobre a gaja que um deles tentou comer ontem à noite. Mas o que saiu daquele palco... Mais de hora e meia de pura adrenalina. A atitude dos álbuns multiplicada até ao infinito, uma energia que também dificilmente me lembro de sentir num concerto, tão simples, tão directo, tão bom! Também durante aquele tempo fui mais um puto, no meio de todos, aos saltos, a cantar as músicas de uma ponta à outra, a gritar os refrões com os braços no ar. Adoro concertos que me façam saltar, gritar, esquecer se o som está bom, analisar cada instrumento, cada música, cada acorde, não estar a avaliar o concerto, mas a vivê-lo. E se o Coliseu não veio abaixo desta vez, dificilmente virá. A intensificar a experiência, já de si exaustiva, estava um calor infernal e sufocante, mas não interessava, já nada interessava. Não há pausas, não há um bocadinho para respirar, as músicas são frenéticas, os crescendos delirantes, e nem as músicas mais calmas nos deixam estar quietos um segundo. Um concerto dos Arctic Monkeys não é uma experiência profunda, não nos coloca num outro universo, não nos leva a sonhar, a partir à descoberta dos detalhes profundos da música, de nós próprios. Não, é simplesmente berserk as fuck!

Sunday, July 15, 2007


Sexta à noite começou com uma pequena desilusão. A expectativa criada, essa tarde, pelo mail do Miguel era perfeitamente justificada. Afinal, basta relembrar o que foi o concerto dos TV on the Radio no SBSR, e entende-se que o facto de Kyp Malone, o carismático guitarrista que contribuiu para um daqueles momentos perfeitos, daqueles em que a semana anterior tinha sido tão generosa, ir actuar ao vivo nessa noite era uma oportunidade imperdível. Não conheço o seu trabalho a solo, mas tenho a certeza que qualquer pequena gota de água no oceano de talento dos TV on the Radio seria merecedora de atenção... e era a oportunidade perfeita de começar a noite. Tinha convencido o Jorge a ficar em Lisboa para Sábado, e informei-o (sem grande oportunidade de escolha) que iríamos ao concerto. Mas a excitação dessa tarde, recebida a notícia da actuação, não permitiu que nenhum de nós se apercebesse que, afinal, o concerto tinha sido na noite anterior.

Alguns dias antes, no Suave, estava a falar com o Pedro sobre os concertos, e ele disse-me que o guitarrista dos TV on the Radio tinha ficado por Lisboa, e estava a ficar em casa da rapariga que estava, naquela noite, a passar música. Anotei a informação, mas só quando, na sexta, recebi o mail do Miguel percebi que ele estava de facto por Lisboa, ainda. Esta sexta, desfeitos os planos, voltámos ao Suave. Tem sido fantástico, quer nos tempos de espera ansiosa pelo festival, quer agora, nestes tempos de saudades do que se passou, sair à noite, ir a sítios onde sabemos que quem está a passar música estava tão ansioso como eu antes do festival, e estará, agora, ainda tão deslumbrado como eu tenho que confessar que estou. Ando imerso em sentimentos contraditórios, e para me proteger do mundo exterior, a exteriorização desses sentimentos é uma luz difusa, muito diferente da claridade habitual. Tenho-me desligado, não por escolha própria, mas porque é assim que tenho reagido, não há uma explicação, não há uma escolha consciente. E a este progressivo desligar tem aumentado, numa direcção oposta, a reacção interna à música que ouço. Que me toca particularmente, e que me leva a viver cada letra, cada acorde, como se fossem os últimos que alguma vez vou ouvir, e que me mantém na cabeça, constantemente, uma qualquer melodia que nunca consigo desligar, e que nestes dias tem sido o que me faz sentir vivo, mais que o bater do coração, ou a respiração que tem dificuldade em ultrapassar a barreira que se formou nalgum ponto entre o meu nariz, a minha boca, e o meu peito. I'm lost in music, como nunca antes. Sair e ir a sítios onde passam a música que eu ouço, escolhida por alguém que não eu, dá-me sempre uma satisfação muito especial. E enquanto estou a ouvir a música, desligo-me das conversas, podia estar sozinho ali, naquele momento, e estaria bem. E esta sexta, no Suave, a música estava assim. Exagerada ao ponto de começar a ouvir o baixo de Ceremony, uma das (muitas) obras-primas de Ian Curtis, na versão dos New Order, são emoções a mais, daquelas que só a música me consegue dar nos últimos dias, mas ampliadas a um nível em que começo a duvidar se existe algo mais que consiga ter a mesma força. Depois de uma ou duas horas acabámos por ir ao Incógnito. E sei que iria ouvir coisas que já tinha ouvido no Suave, e tantas outras, mas não estava preparado para a surpresa que teria, ver as paredes decoradas com versos dos Interpol. Logo os Interpol, logo onde nunca o desencanto e o desespero foram tão belos, tão sinceros, tão vividos. Foi nestes versos que me refugiei do mundo no dia em que vi os TV on the Radio, e os Interpol ao vivo, foram eles que me mantiveram vivo, acordado, nesse dia, foi neles que revivi tudo o que se estava a passar comigo. E agora a cada esquina, a cada novo pedaço escondido de parede, confrontam-me, agridem-me, ajudam-me a recordar, a sentir, como se não houvesse fuga possível. Ou apenas uma...

Tal como o Super Bock poderia apenas ter terminado assim (porque eu quis que terminasse assim, porque não quis arriscar a que os Underworld adormecessem a magia daquela noite, vencida pelo meu cansaço), com os Interpol, esta noite podia apenas ter terminado assim. O acaso teima em levar-me ao encontro das pessoas com quem me tenho desencontrado, e nesta noite teimou em fazer com que me cruzasse com Kyp Malone, o próprio, em direcção ao Incógnito muito provavelmente, de onde eu tinha acabado de sair. Com a satisfação de saber que também ele se ia cruzar com os Interpol, mais uma vez, nesta noite. Posso sempre dizer que esta foi a noite em que vi Kyp Malone, ao vivo, pela segunda vez.
Próxima paragem: Arctic Monkeys, quarta-feira à noite...

Tuesday, July 10, 2007

Mais um momento de magia. Momentos em que a última semana foi pródiga, dos que nos fazem sonhar, ter medo, entrar em êxtase, em histeria. Momentos pelos quais, tenho que admitir, ansiava já há algum tempo. Que me mantiveram com um nervoso no estômago, que foi piorando até se tornar em insónias nas noites anteriores. E do qual guardo recordações que não vou esquecer nunca, novas paixões, novos sons que me vão deixar fora da minha cabeça por muito tempo, certamente, depois destes dias.
A preparação começou com a antecedência necessária à preparação dos grandes momentos. Esta passou por reunir, religiosamente, as discografias de todos quantos iam ter oportunidade de pisar o palco do Super Bock Super Rock deste ano de 2007.
Descobrir algumas bandas que ainda não tinha tido oportunidade de descobrir, redescobrir algumas com as quais tinha tidos contactos algo efémeros, ou pouco aprofundados, ouvir até à exaustão aquilo que me tem ocupado nos dias que correm (e se há dias que correm...), ou reatar uma relação algo perdida com uma das paixões da adolescência, que adormeceu no tempo sem eu dar por isso, e da qual sentia umas saudades de que nem me tinha apercebido. De todos eles ficaram marcas, profundas, claras, nítidas, contrárias aos sentimentos que me despertam aquelas três noites mágicas, de sonhos e sons difusos, de confusão de acordes, de palavras, de imagens, de uma multidão aos saltos a viver, comigo, os momentos únicos da totalidade daquelas noites. Vai ser difícil a objectividade da análise, como vai ser difícil fugir ao meu exagero habitual de adjectivos.

Decidi ir, com o Miguel, ao dia em que actuavam os Metallica. Não sabíamos se haveria que tratar de pulseiras (não era o caso), queríamos (re)descobrir os cantos à casa e, aproveitar o momento para ver ao vivo, pela primeira vez, uma das bandas importantes da minha infância. Não, não é deste reencontro que falei no início do texto, este não teve metade da magia, e serviu para, definitivamente, enterrar as minhas primeiras experiências musicais. Chegámos a tempo apenas de ver os Metallica e, sinceramente, foram uma grande desilusão. Esperava-o, mas não pelos motivos que acabaram por se revelar. Esperava músicas recentes, afinal desde o Black Album que não houvia nada deles. Foi um álbum importante, aos meus 12 anos, é um facto. Não tanto como os anteriores, mas importante. E eram, na altura, uma das minhas bandas preferidas. Perder o contacto com uma banda durante mais de 10 anos fazia-me prever um concerto de meia dúzia de músicas conhecidas, e um desenrolar infindável de músicas que nada me diriam. O resultado foi um desenrolar infindável de músicas, conhecidas, mas que nada me diziam já. Mesmo as músicas pelas quais mais esperava, como Fade to Black, Master of Puppets ou One não me tocaram particularmente. Conhecia todas as músicas ainda com uma claridade impressionante, sabia grande parte das letras, mas não as conseguia situar em termos de albuns ou nomes, foi estranho, desligado. A somar a isso, não estou habituado a palcos grandiosos, a fogo de artifício, a espectáculos que distraem da música e que, neste caso, distraem de alguma falta de profundidade de sentimentos (apesar de violentos, são demasiado superficiais), de profundidade da composição, da estrutura musical. Admirei-me ainda mais por terem tocado uma, no máximo duas, músicas posteriores ao Black Album. Mais um contributo para a estranheza de todo o concerto, e para a minha desilusão. Não voltei, agora, a ouvir nada deles, mas esperava sentir a magia que sentia, em criança (just kidding), por eles. E assim se queimou, definitivamente, o livro do metal na minha vida, há longos anos fechado nas trevas.

Fazendo fast forward de alguns dias de antecipação quase doentia, começam os dias realmente importantes, os que me deixaram sem dormir, os que conseguiram reunir, em três noites, algumas das bandas mais importantes no (meu) panorama musical. O iPod não tinha rigorosamente nada que não viesse ao Super Bock, quando já não sabia o que havia de ouvir, bastava perguntar ao Luís, que ele sabia... Esteve longe da capacidade o iPod, nesses dias. Como eu, que estava longe de me fartar de esta sempre a ouvir as mesmas coisas.
A começar por uns rapazes, cujo único álbum até agora, consegue transpor os seus temas mais ou menos místicos para um som bastante enérgico, na atitude muito inglesa de misturar a cultura rave num som rock, que soa a pop, e a piorar a coisa, fica no ouvido. Tenho ouvido o Myths of the Near Future, e gosto das letras, da agressividade brilhante, caótica, com momentos muito inspirados. Foi um concerto simples, directo, sem a grandiosidade de algumas das músicas do álbum, mas bastante competente. Na minha opinião, não serão mitos de um futuro muito longínquo (sorry lads), mas o presente é bastante bom, e foi um concerto que deu início, da melhor maneira, à maratona que se seguiu.

Gostei muito do primeiro álbum dos Magic Numbers. Quase tanto como a rapidez com que o pus de lado. E como a indiferença com que ouvi o segundo álbum e senti que não trazia muito de novo. Não têm, nem de perto, o brilhantismo de uns quantos rapazes de Glasgow neste tipo de música. As composições são algo simples (apesar de bonitas), as letras não encantam, apenas dizem que o amor é bonito, a vida bela, de uma maneira que todos sabemos que, de facto, é verdade, e o seu visual demonstra que, tivessem ouvido as músicas certas, lido os livros certos, até podiam criar alguns grandes momentos musicais. Competentes ao vivo, conseguem transmitir bem a mensagem, e os sentimentos das músicas, e brindaram-me ainda um segundo regresso ao passado, ao tocarem num medley final parte do Night Train dos Guns N' Roses. Não me tocaram particularmente, e provavelmente a culpa nem foi deles, foi do resto do cartaz. Uma das duas bandas "principais" do festival que menos curiosidade tinha de ver. Não desiludiram...

E começa um dos momentos grandes destes dias, os Bloc Party. Desiludiram-me com o segundo álbum, e nem uma música inspirada no Less than Zero, um dos meus livros de culto, do meu escritor de culto, consegue salvar o que considero um álbum apenas razoável. Principalmente depois de um primeiro álbum tão brilhante como Silent Alarm. Ao vivo, no entanto, as músicas do segundo álbum resultam muito melhor que no álbum. A energia, a bateria omnipresente, a voz de Kele, a velocidade, foram momentos de descarga pura de adrenalina, de uma banda muito consciente da dimensão que adquiriu, e de como adquiriu essa dimensão, com um som, mais uma vez, muito britânico, mas com uma força inquestionável. Saltei bastante, gritei bastante, foi um grande concerto.

A noite acabou com o que considero um dos grandes concertos do festival. A Susana não deixa de ter razão, o Arcade Fire estão a um nível demasiado alto, e o concerto perde alguma da espontaneidade, tem uma precisão milimétrica, está demasiado próximo da perfeição. Eles são muito bons, sabem-no, e este concerto não vi neste palco metade do caos que vi no palco de Paredes de Coura, há dois anos, quando os vi pela primeira vez. Todo o concerto está estudado ao pormenor, nenhum detalhe é deixado ao acaso, foram até um pouco arrogantes quando, no final das músicas, todas as pessoas continuaram a cantar as músicas mas... a verdade é que foi um concerto brilhante, onde nenhum detalhe foi deixado ao acaso, onde toda a orquestração (porque tocam como se de uma orquestra se tratasse), se conjuga numa violência perfeita, difícil de descrever, difícil de destacar um ponto forte e onde, certamente, não há pontos fracos. Espero que não se percam antes do lançamento do próximo álbum, antes do próximo concerto que eu veja deles. Estão no topo das suas capacidades (since the word go, com aquele primeiro álbum), é preciso que deixem o caos reinante na composição das músicas de Funeral não esmorecer. Porque são, de facto, uma das melhores bandas da actualidade, em disco ou ao vivo.

Another day, another time, another way for the moment, watch it for a sign. O dia começou atribulado, com uma chegada tardia que me fez temer não ver uma banda muito especial, com um rapaz que tem uma voz muito especial, com um primeiro álbum muito especial. Adoro Clap Your Hands Say Yeah! Queria ter visto os Rapture, gosto bastante do segundo álbum, e tenho curiosidade de os ver ao vivo, mas nem me importei tanto com o facto de terem cancelado o concerto, porque o programa se atrasou e vi os Clap Your Hands. E aquele rapaz, de boina, de voz desesperada, num falsete desafinado, hipnótico, consegue com uma simplicidade extrema passar para nós o sofrimento que lhe vai na alma. E de uma maneira tão bela quanto a sua voz insólita toma conta de nós, e nos envolve, e nos leva a bater palmas, mesmo quando não temos mais sonhos a que nos agarrar. Nem dinheiro. Adorei.

Antes dos Clap Your Hands Say Yeah!, tive oportunidade de assistir ao fim do concerto dos portugueses Linda Martini. Tinha que falar deles, porque gostei bastante. Ouviram muito shoegazing, My Bloody Valentine, quem sabe Band of Susans ou Swervedriver. Fizeram bem, não estão nada mal. E conseguir cantá-lo em português não deve ser nada fácil.

De seguida os Maximo Park. Não trazem nada de novo a meu ver, o primeiro álbum tem músicas bastantes boas (mas poucas), e quer o restante, quer o segundo álbum, não... Ao vivo, também não resultaram na perfeição, apesar do incansável Paul Smith (que apesar de não desenhar roupa, cantou com um very british hat), de uma simpatia extrema. Alguma coisa falta ao seu som, ou às músicas, ou ao conjunto. Parecem-me um bocado presos ao estereótipo da banda de guitarras inglesa que quer pôr toda a gente a cantar os refrões em Glastonbury. Não sei, até queria ter gostado mais do concerto, mas foi normal (o que dentro dos padrões que tenho que tentar impôr neste SBSR, não é nada mau).


E começa a magia. Da que eu não consigo, infelizmente, criar, daquela que esmaga, que nos faz sentir pequenos e perdidos, daquela que nos dá asas e nos leva a voar para outros universos. Este foi o grande reencontro, que não julgava possível (tal como os Pixies), e que se tornou realidade. Na altura, não tinha os álbuns deles (nem sempre era fácil, numa época em que não havia mp3... mp3? Nem CDs havia...), tinha algumas músicas perdidas em cassetes, tinha a memória de ouvir os álbuns, tinha o Just Like Honey como uma das músicas mais marcantes na minha cabeça, tinha a depressão, a que somos tão permeáveis na adolescência (e não só), a brutalidade de uma beleza indescritível, uma brutalidade que me levou a sentir mal disposto, a querer viver a minha vida toda naquele momento, a não me importar de morrer. Foi irreal, e dificilmente consigo fazer uma descrição racional do que vi durante o tempo em que estiveram em palco, porque não estive lá, porque andei a mergulhar na obscuridade de um tempo que parece já não existir, porque eu quase não aguentei aquele concerto. Por tudo. Sem dúvida não foi, nunca, mais mágico que isto.

E para terminar o dia novamente numa nota muito, mas muito, alta, James Murphy, o próprio, como só ele sabe fazer. Como só ele canta, como só ele nos atira para cima a sua estante de muitos milhares de CDs. Talvez o primeiro caso de mosh desde o concerto dos Metallica, talvez o primeiro justificado. Porque um concerto dos LCD Soundsystem é sempre um momento esquizofrénico, porque não é rock, não é electrónica, porque estão muito no controlo do seu jogo, mas continuam de uma simplicidade arrebatadora. Não levamos a mal se James entrar depois dos restantes elementos para receber os aplausos, porque ele merece, porque continua ele próprio, de quem admite que está a perder a vantagem para os putos que têm uma compilação de todos os grandes hits dos anos 60. Porque James não precisa, tem na sua cabeça a compilação de toda a grande música feita por todas as pessoas, desde sempre. E porque a transforma naquela que é alguma da melhor música, e mais importante música feita nos dias de hoje. E porque adora Fall e eu também, e porque, a terminar o concerto mais explosivo deste SBSR, ainda nos brindou com No Love Lost, a recordar um Ian Curtis que só lhe pode ser muito querido, como o é a mim. Tal como os LCD são um dos bens mais preciosos dos dias de hoje. Para acabar um concerto onde todas as músicas foram levadas ao extremo da violência, só podíamos ser brindados com uma versão ainda mais bonita, mais Broadway, mais Manhattan de New York I Love You, But You're Bringing me Down. Um dia como este só podia ter terminado num momento como este.


O último dia guardava ainda algumas surpresas, e a antecipação de mais momentos muito especiais era enorme. Começou com os Gossip, que não consigo evitar olhar para como os outros olham, como um freak show. O que é pena, porque o Standing in The Way of Control é um álbum brilhante, punk sem pretensiosismos, simples, directo e inteligente. Com mensagem, como todo o punk deveria ter. Um concerto punk no seu melhor estilo, uma voz incrível, uma simplicidade de ter uma bateria, um baixo ou uma guitarra, e a prova que o punk, feito com inteligência, é uma das melhores armas para acabar com a indiferença.

E de seguida, mais magia. Tinha muita curiosidade em ver os TV on the Radio ao vivo, mas nada, nada, me podia preparar para o que foi o concerto deles. All your dreams are over now, and all your wings have fallen down. Mas não me importava, já nada importava, só a música. E que música. A influência artística contemporânea em todo o som, as imagens, as metáforas, as letras, a impossível força de tudo o que é transmitido, os movimentos. Uma revelação, depois da revelação que já tinham sido os álbuns, desde o "Desperate Youth, Blood Thirsty Babes", brilhante desde o título até à última música, e que o Eduardo tão rapidamente me impingiu assim que os descobriu, até ao mais maduro, mais complexo, mais denso, mas igualmente brilhante Return to Cookie Mountain. O seu som ao vivo é de uma mestria imensa, uma parede de distorção fascinante a cobrir toda uma profundidade raramente encontrada. Esteve muito talento naquele palco naqueles dias, mas dificilmente atingiu um nível tão completo. A grande surpresa, não esperava um concerto destes num final de tarde daqueles. Staring at the Sun, até este se pôr por trás do palco.
Seguiram-se os Scissor Sisters, pelo quais confesso já ter nutrido uma maior admiração. Nomeadamente depois do grande concerto que deram no Lux, há uns anos atrás, depois do primeiro álbum. O segundo ouvi-o uma ou duas vezes, e não me diz muito. Adoro a mentalidade completamente aberta, a sua desinibição em palco, a sua falta de hipocrisia, o facto de adorarem drogas, sexo, e de gostarem que toda as pessoas saibam disso. Agora, a música... Continuam a conseguir encantar em dois extremos opostos, baladas como Mary, ou músicas a abrir como Filthy / Gorgeous, mas o in-between é penoso. E músicas como I don't Feel Like Dancing não me aquecem nem arrefecem, sinceramente. Mas foi uma boa maneira de me entreter, e tentar esvaziar a cabeça para o que viria a seguir...

E veio em grande. Não sei como é que não pus os Interpol no meu post de bandas preferidas. Porque o são. E o Turn on the Bright Lights é um dos álbuns mais brilhantes de todos os tempos. E os Interpol são, ao vivo, uma experiência tão intensa como todo aquele brilhante primeiro álbum. Como os brilhantes Antics e Our Love to Admire, como todas as influências se fundem num som único, e numa capacidade de escrever canções que, claramente, não está ao alcance de nós, meros mortais. E de as tocar ao vivo com uma precisão, com uma intensidade, com uma alma, que conseguiu fazer esquecer tudo o resto, que fez viver cada momento de cada uma daquelas músicas como se não existisse o resto do mundo, como se não existisse um dia seguinte, como se tudo tivesse começado ali, naquele momento, naquela perfeição, naquela guitarra. Não vou escrever mais sobre eles, porque não me sinto capaz. Porque fiquei rendido, completamente, aos meus sonhos, todos, naquele momento. Porque todos os desabafos, angústias, desesperos do Paul desabaram sobre nós durante aquele concerto. Porque por trás da luz azul, mágica, da primeira fotografia deste post, se escondiam os Interpol.

As fotos são da Susana, a quem quero agradecer por me deixar pô-las aqui. E por me ter aturado durante estes dias...

Tuesday, March 27, 2007

O começo...

Tal como o meu co-blogger do bureau, inicio a participação aqui no blog contando um pouco da minha história com a música. Musicalmente falando tive, até hoje, três paixões.

Tudo começou com os U2. Foi um começo tardio. Sempre gostei de música, mas nunca fui um interessado no tema. Antes disso, recordo apenas um interesse “desinteressado” nos Queen. Nada de muito original.

O primeiro concerto dos U2 em Alvalade foi um clique na minha vida. Na altura até nem era grande apreciador da banda irlandesa. Mas o espectáculo foi inesquecível e em breve estava a arranjar a discografia toda dos U2. E que discografia: do Unforgettable Fire até ao Zooropa (que inclui também The Joshua Tree, Rattle & Hum e Achtung Baby) foi, sem dúvida, o que de melhor se fez em finais da década de 80 e princípio da de 90.

A minha fidelidade aos U2 foi posta em causa quando me falaram de uma banda chamada Tindersticks. Que eu havia de gostar, pois era o meu género! E de facto, desde logo me rendi incondicionalmente aquele som melancólico, mas tão melodioso. Todos os álbuns deles são bons, mas se tivesse de destacar alguns, o homónimo Tindersticks era um deles, juntamente com Curtains e Waiting for the Moon. Com o estertor dos Tindersticks, surgiu Stuart Staples com uma (promissora) carreira a solo.

Finalmente, os Arcade Fire. Com Funeral, para mim, o melhor álbum que ouvi até hoje, a música alcançou a quase perfeição. São dez músicas todas elas boas, algumas maravilhosas. Com Neon Bibles, não foi possível atingir o mesmo patamar. Só mesmo com uma banda como os Arcade Fire é possível ficar desiludidos com este álbum. Para qualquer outra banda, seria sempre um bom álbum.


Para além disso, tenho tido alguns "flirts" ocasionais. Correndo o risco de ser injusto , não posso deixar de referir James, Cure, Radiohead, Placebo, Interpol, The Walkmen, Decemberists, Coco Rosie e Sigur Rós.

Correndo o risco de ser herege, bandas como os Smiths, Stone Roses, Joy Division, Clash, e tantas outras, que são uma influência e fonte de inspiração para todos aqueles que ouvem música mais alternativa, a mim, são-me relativamente indiferentes. Quem sabe um dia...

Friday, March 23, 2007

Com o entrar na idade musical adulta, o vincar das preferências serviu, juntamente com a bagagem que vinha da adolescência, para definir mais claramente as minhas predilecções musicais. A tecnologia achou por bem acompanhar esta evolução, e do LP da 5ª Sinfonia, passei à cassete dos Pixies e Mata-Ratos, ao CD do Introduce Yourself dos Faith No More, ao Mini Disc do Mellon Collie and The Infinite Sadness, que deu lugar a milhares de MP3, sei lá eu de quê.
Chegado que estou a este ponto da minha viagem, posso indicar quais as paragens musicais que considero fundamentais. Alguns grupos que se destacam claramente, e pelos quais tenho um respeito e admiração enorme.
Não acho que faça muito sentido falar d'A banda preferida, d'O álbum preferido. Seria uma lista com uma mudança quase diária, depende do momento, do estado de espírito, de um concerto ou de um momento memorável recente passado a ouvir uma música. De qualquer forma, com uma ordem mais ou menos arbitrária vou tentar dar a conhecer aquelas que são, para mim, as cerca de 10 (vamos ver se me consigo conter pelo número) melhores bandas de sempre. Ou do meu sempre, se preferirem.
Aproveito, desde já, para pedir desculpa a todos os músicos brilhantes que fiquem esquecidos, e a todos os que não aparecem na lista. Eu sei quanto seria importante para vocês...

Os Yo La Tengo são os fortes candidatos ao topo da minha lista. Há vários anos que os acompanho, desde os primeiros tempos, através de infindáveis minutos de distorção. Uma evolução constante do seu som, sem nunca perderem a identidade e, mais fundamentalmente, uma capacidade de criar músicas que, sem deixarem de ser rock, fundem influências e estilos nalguns dos mais belos momentos musicais dos últimos anos. Destaco o álbum Electr-O-Pura, por ser o que me abriu os olhos (deveria dizer ouvidos) para quão fantásticos estes dois rapazes e rapariga são. Em cada novo álbum reinventam-se, mas mantêm uma qualidade musical muitos furos acima da média.

Belle & Sebastian... bem, a minha relação com os Belle & Sebastian tem vindo a decair um pouco. Creio que isso se deve à evolução da sua música ser mais no sentido da produção (nem sempre uma coisa boa), do que da evolução da música em si. São assumidamente pop, mas com composições lindíssimas foi-me impossível não me render ao encanto destes rapazes, raparigas e sabe-se mais o quê de Glasgow. As suas letras com tanto de inteligência como de ironia, acompanhadas por dotes de composição musical igualmente fabulosos criaram algumas das mais belas melodias pop do meu sempre. Os seus últimos álbuns não têm, na minha opinião, trazido nada de novo, apenas mais músicas lindíssimas, mas isso não é uma desilusão, pelo contrário. O meu álbum de eleição é o The Boy With the Arab Strap. Ouvi-lo pela segunda ou terceira vez transformou-se numa tarde inteira a ouvi-lo, e na compra no dia seguinte da discografia completa do Belle & Sebastian.

Os Pixies não foram só aquela primeira cassete, são de facto uma das bandas mais fantásticas de sempre. O surrealismo latente no seu som, e nas suas letras (o próprio Buñuel teve direito a homenagem), o total descomprometimento da sua obra, a sua energia ao vivo, são motivos mais que suficiente para ter que os considerar fundamentais. Uma vez que os comecei a ouvir com o Trompe Le Monde, a dissolução pouco tempo depois causou-me um enorme desgosto que durou vários anos, nunca os ter visto ao vivo. Pois já os vi nas últimas três visitas a Portugal, e vê-los-ei sempre que cá vierem, certamente, são a única banda que me põe aos saltos e aos berros durante um concerto, das quais não vos sei dizer se os concertos foram bons, se tocaram bem, o que fôr, não estou lá... Acho que não preciso dizer qual o meu álbum preferido, o seu álbum mais punk parece que foi feito para mim.

Os Sonic Youth, não tenho qualquer dúvida que são das bandas mais importantes para a música contemporânea (a que me interessa, pelo menos). Mais uma banda que, mantendo sempre o seu som tão original e característico, conseguiu evoluir e criar álbum atrás de álbum, sempre diferentes, mas sempre incríveis. A forma como exploraram desde o início o que era possível fazer com uma guitarra, como transformaram o ruído em melodias quase pop por vezes, com uma força e uma harmonia extraordinárias. São absolutamente fundamentais, influenciaram quase tudo o que se ouve hoje e empurraram sempre os limites da música, introduzindo nela elementos da sua inesgotável criatividade, não apenas musical. Apesar de adorar as suas obras mais experimentais, tenho que eleger Goo como O álbum. A forma como conseguem tranformar ruído em músicas tão fantásticas é uma pequena amostra do seu enorme talento.

Sugar... bem... sim, eu sei, os Hüsker Dü foram mais importantes para o rock alternativo, foram a primeira banda a assinar por uma major sem isso implicar qualquer alteração na sua orientação musical (os seus contemporâneos R.E.M. não poderão dizer o mesmo...). É óbvio que qualquer uma destas duas bandas (Sugar e Hüsker Dü) é fruto do talento inesgotável de Bob Mould, mas elejo os Sugar porque, nos seus momentos mais altos, são inatingíveis. O talento de Bob Mould como compositor encaixa perfeitamente na sua mestria com uma guitarra. As melodias densas, pesadas, complexas, com as suas letras crípticas e a sua voz perdida nesta amálgama não são mais do que uma descrição da sua maneira de tocar. A grande diferença é que nos Sugar teve a acompanhá-lo talvez uma das melhores duplas de baterista / baixista rock de sempre, em actuações ao vivo é inacreditável como não falham uma batida, em músicas com uma tal violência, intensidade e complexidade. Como álbum preferido elejo o Beaster. Não se trata bem de um álbum, mas de uma colecção das músicas demasiado brutais para encaixar no Copper Blue. Como sempre, Bob Mould está no seu melhor quando deixa as emoções fluir mais violentamente - o que não impede os Sugar de ter baladas tão belas como "Hoover Dam" ou "Explode and Make-Up".

Que dizer dos Velvet Underground, o início de tudo? A sua música é tão claramente inovadora, mesmo para os padrões de hoje, que é quase inconcebível ter 40 anos. Claro que o ambiente da Factory (de Andy Wahrol, ainda não de Tony Wilson) foi propício à total liberdade artística da banda. A sorte de contar (inicialmente, pelo menos) com os génios de Lou Reed (o lado pop) e John Cale (o lado experimentalista e um talento raro de composição), ajudaram a transformar para sempre a face do Rock N' Roll. A sua estreia, Velvet Underground & Nico, é um dos álbuns fundamentais da história da música. O uso livre da guitarra, a estrutura rítmica não linear das músicas, a abordagem de temas como as drogas, o sado-masoquismo, o underground de Nova Iorque são as fundações e a inspiração, atrever-me-ia a dizer de todas as bandas que os sucederam.

É quase criminoso o ignorar dos The Fall como fundamentais para o desenvolvimento da música alternativa. A maneira como pegam na raiva, na crítica, no som do punk, e lhe acrescentam profundidade, inteligência e complexidade é fabulosa. A voz carismática de Mark E. Smith é de tal maneira marcante, que James Murphy não resiste a usá-la frequentemente nos seus LCD Soundsystem. As suas letras carregadas de inteligência e ironia, de que se aproveitam para fazer críticas sociais profundas, aliam-se a uma secção rítmica que, para mim, marcou o início da música de dança como a conhecemos, e logo no rock. Um álbum? The Infotainment Scan foi o que mais me marcou.

Joy Division são tudo o que os Fall foram, de uma forma mais negra, mais densa, mais pesada, mas igualmente genial. A sua curta carreira deu-nos uma tal colecção de músicas que não se lhes pode ficar indiferente. O seu papel foi, tal como os Fall, fazer a ponte entre o punk puro e duro (não que haja nada de errado com ele) e uma música mais aprofundada, mais cuidada, sem perder a sua filosofia de revolta.

Galaxie 500. Quem diria que os americanos tinham no sangue uma melancolia quase tão profunda como a nossa? Pegam em punk, e transformam a raiva em melancolia. As suas músicas são arrepiantes, a voz de falsete, o trabalho rítmico tão incrível como o dos Joy Division, a sensação de juventude perdida, dos Estados Unidos dos cemitérios de comboios, raramente a música foi tão bela, tão hipnótica, tão desesperadamente marcante. É impossível não me sentir estranho depois de os ouvir, escolher músicas ou álbuns é quase impossível, parece que os fantasmas que residem nos seu interior vão voltar para nos atormentar.

Também do outro lado do Atlântico apareceram os Mercury Rev. Irmãos espirituais do Flaming Lips, são os culpados destes não aparecerem nesta minha lista. Acho que o brilhantismo de Wayne Coyne nos Flaming Lips é suplantado pela extrema beleza que os Mercury Rev conseguem trazer com cada novo álbum. A evolução do seu som é muito notória e Boces é, para mim, o álbum que melhor faz a ponte entre uma dose de experimentalismo muito saudável e uma beleza de composição musical encantadora.

Para terminar o périplo americano, quero falar um pouco dos Guided By Voices. Costumo dizer que a quantidade de músicas absolutamente incríveis, com pouco mais de um minuto, que os GBV lançaram davam para dezenas de singles número um numa banda com pretensões comerciais. Vi uma vez Robert Pollard comparado a Mozart em termos de capacidade de composição. Isto é talvez um exagero, mas menos absurdo do que possa parecer à primeira vista. Nunca ter ouvido Under the Bushes, Under the Stars é perder um dos melhores álbuns de rock de sempre, mesmo para ouvidos destreinados a quantidade de acordes que não saem do ouvido é sempre muito acima da média. As letras totalmente surrealistas não deixam de me fazer agradecer os raros momentos de sobriedade de Pollard.

Segundo Ian Brown, os Stone Roses eram a melhor banda do mundo quando estavam no seu auge. Quem sou eu para duvidar, Stone Roses é na minha opinião um dos melhores álbuns de sempre. Dificilmente encontramos uma colecção de músicas tão fantástica como esta, a voz de Ian Brown, a guitarra totalmente rendida a Squire, são minutos de pura magia. Com um primeiro álbum destes perdôo-lhes um segundo álbum que, não sendo mau, não tem metade da inspiração do primeiro.

A minha paciência para escrever esgota-se, a vossa já se esgotou certamente, mas os Smiths não podiam faltar na minha lista. O canto lírico encontra a pop, a androginia do seu som, associada à aparente facilidade de criar músicas brilhantes criou em The Queen is Dead um dos meus álbuns favoritos de sempre. Marcaram de forma indelével toda a música, e foram os percursores, quem sabe, do fenómeno britpop, tendo aberto caminho, ao cativar um público mais rock que certamente se sentiu desconcertado por descobrir até onde é que o som podia ir.

Last but not the least, os Stereolab. Tenho que admitir que adoro ouvir falar francês, e a voz de Laetitia Sadier apaixonou-me quase de imediato. O uso de uma parede de som electrónico onde se escondia o resto da música inicial puxou-me para um som que ainda hoje acho fabuloso. O facto de conseguirem evoluir até ao som que praticam hoje em dia, apesar de soarem a algo tão novo e diferente de início deve-se certamente a uma cultura e capacidade musical fantásticas. As influências tão díspares que transmitem, as suas letras altamente interventivas e utópicas, a beleza de todo o conjunto fazem deles uma das minhas bandas pop preferidas. É difícil destacar um disco, mas talvez Transient Random - Noise Bursts with Announcements.

Thursday, March 22, 2007

O início foi apenas o início, mas tomei de imediato contacto com as bandas que me marcaram mais profundamente. A colecção de música do meu tio era mais limitada, e as bandas algo mais mainstream, e portanto era mais fácil a selecção do que me interessava. Com os meus primos era diferente, a colecção era bastante maior, mais diversificada e mais desconhecida. O meu processo de selecção passava por ouvir CDs em fast forward, bocados de músicas, ver o que poderia interessar ou não e, claro, aceitar as sugestões. Foi então que descobri álbuns que me marcaram definitivamente. Álbuns que tinham tanto de desconhecido como de brilhante incluem "Mezcal Head" dos Swervedriver, "Hot Boxing" dos Magnapop, "Empire of the Senseless" dos Senseless Things, "Magic Happens" dos Family Cat, "Panic On" dos Madder Rose, "On Fire" dos Galaxie 500, "The Infotainment Scan" dos Fall, "Veil" dos Band Of Susans ou "San Francisco" dos American Music Club. Outras coisas, já não tão perdidas como as anteriores, Sex Pistols, Tindersticks, Yo La Tengo, Mão Morta, Joy Division, Flaming Lips, e Mercury Rev. As bandas mais importantes, no meio disto tudo, os Stereolab, Sonic Youth e principalmente Sugar, que depressa se tornaram, a par com os Pixies, uma das minhas bandas de referência.
A par destas descobertas mantinha-se o gosto por Guns N' Roses, Metallica, AC/DC, Faith No More e pela explosão do grunge, que dificilmente deixava alguém indiferente na altura, eu não era excepção. Nirvana e Pearl Jam foram, talvez, as bandas que mais marcaram a época, e a mim também. Na noite em que soube da morte do Kurt Kobain ouvi a discografia completa dos Nirvana até altas horas. OK, eram gostos algo comerciais, mas não ouvia estas bandas pelos singles, conhecia os álbuns todos, as músicas todas, muitas das letras, as músicas preferidas nem sempre eram as mais rodadas. Sempre tive tendência para rejeitar o mais fácil, o que não desse luta, e a música não era excepção.
Nesta fase, dava para reparar na minha predilecção por guitarras. Aliás, não apenas minha, do mundo inteiro. E, curiosamente, o mérito de desarmar a minha resistência à música electrónica foi, mais que dos Fall, dos Mão Morta. Mais concretamente a música "Cães de Crómio" do álbum "Vénus em Chamas".
A partir daqui os gostos evoluíram, naturalmente na minha opinião. Quando se começa a ouvir determinados álbuns, começa-se a perder o interesse por outro tipo de música, menos elaborada, mais "fácil", menos desafiante, menos desconcertante. Rapidamente os Guns e os Metallica perderam a batalha contra os Yo La Tengo, Mercury Rev ou Flaming Lips. Pixies e Sugar mantiveram-se sempre no topo das preferências.
"I'm lost in music, caught in a trap, and there's no looking back. I'm lost in music"

Wednesday, March 21, 2007

Uma boa maneira de começar a minha colaboração neste espaço será, talvez, contar toda a história da minha vida. Ou, dado que a história teria tanto de longo como de desinteressante, limitar-me-ei ao mais importante.
Nesse caso, posso dizer que a minha vida começou cerca dos 12 anos, apenas, devido ao lançamento de um álbum chamado "Trompe Le Monde". De facto, a saída de cena dos Pixies coincidiu com o despertar do meu interesse musical. Até aí tinha-me limitado a vasculhar desinteressadamente a secção de vinílicos dos meus pais, onde se incluíam Beatles, Moody Blues, Santana, Beach Boys e sei lá eu que mais.
Aliás, minto. Desde bastante pequeno, a 5ª sinfonia do Ludwig Van e as 4 Estações do Vivaldi foram companhias inseparáveis de várias tardes de tédio infantil. Sabia-as religiosamente, e obrigava os meus companheiros de brincadeira a ouvi-las enquanto brincávamos, provavelmente às escondidas, ou qualquer coisa do género. Além disso, tinha uma cassete gravada com um Jackpot 80 e tal, por causa da música Woodpecker From Space, e que tinha, entre outras coisas, o tema principal do filme Ghostbusters e, principalmente, Frankie Goes to Hollywood. Mas o interesse pela música era ainda uma coisa latente, e portanto acho que se pode fazer fast forward para o ano de 1991, mais coisa menos coisa.
Tardes infindáveis em almoços de família têm destas coisas, e quando eram em casa dos meus primos mais velhos tinham a vantagem acrescida de horas e horas de busca incessante entre a sua invejável colecção musical. Um dia levei-lhes uma cassete, na qual gravaram o Trompe Le Monde (directamente do seu vinil acabado de comprar) no lado A, e o Rock Radioactivo dos Mata-Ratos no lado B. E foi assim que tudo começou, com um álbum que é, ainda, um dos meus álbuns preferidos, e com outro que... bem... talvez explique qualquer coisa sobre o meu gosto pelo punk.
O meu súbito interesse por estas coisas da música teve dois pontos de contacto importantes, os meus primos, que já referi, e o meu tio. E apesar de a minha primeira cassete (OK, segunda, mas a outra não conta) ter sido gravada pelos meus primos, a música que o meu tio me passava teve um pouco de primazia nos primeiros tempos. E os gostos dele eram um bocadinho mais pesados. Então, junto com a minha cassete de Pixies, apareceram cassetes de Faith No More, Metallica, AC/DC, Guns N' Roses, Megadeth (eu sei, eu sei), mas também Velvet Underground. Aos gostos mais eclécticos dos meus primos, juntava-se o rock puro e duro, e a partir daí nada seria como dantes. Sabia os álbuns, as músicas e as letras de cor.
"It's the beginning of a new age"