
Lembro-me do dia em que ouvi, pela primeira vez, algo muito próximo dos Blues. Encontrava-me no parque de estacionamento de um dos hipermercados da nossa praça, aguardando o regresso dos meus Pais e, como de costume, ficava no carro a ouvir rádio. A música: “Chill Out (Things Gonna Change)”. O músico: John Lee Hooker.Aquela voz rouca, misteriosa, dura, crua e pura... Cada palavra parecia ter o peso de uma vida. Uma vida de desgostos e tristezas, uma vida igual a tantas outras, do seu e do meu tempo. Mais tarde descobri que toda esta tristeza vinha do tempo da escravatura.A partir desse dia sempre que tive oportunidade comprei discos de blues. Comecei por John Lee Hooker do qual recomendo: “Burning Hell”, “It Serves You Right to Suffer” e “Chill Out”, e ainda não comprei todos os discos que quero comprar, nem me parece que algum dia o vá conseguir.Mais tarde conheci Robert Johnson, aquele a quem chamam a primeira estrela da cultura popular. Este título provém da lenda que se conta no Mississipi, em que Robert Johnson após várias tentativas frustradas de tocar guitarra, dirigiu-se a uma encruzilhada onde vendeu a sua alma ao Diabo em troca de uma capacidade única para a execução do instrumento. Passado pouco tempo apareceu morto. Hoje é considerado por vários músicos, e por mim, um dos guitarristas mais influentes de todos os tempos. Gravou apenas 24 músicas durante a sua vida, influenciou e continua a influenciar, comparáveis a este facto apenas Jeff Buckley e os Sex Pistols. Qualquer edição discográfica destes 24 temas é obrigatória para qualquer amante deste género musical. Recomendo a audição de “Rambling On My Mind” com o volume o mais alto possível e de preferência às escuras. Falando do nosso Portugal... considero The Legendary Tiger Man o mais excitante executante deste género, adoro a postura punk mesclada com a profundidade do sentimento bluesy. Recordo com saudade o Festival de Blues de Gaia onde assisti a concertos espantosos de Pinetop Perkins, Lucky Peterson, Eric Sardinas, Eddy Clearwater Blues Band...Passados todos estes anos continuo a estudar o enigma em volta deste género musical. Hoje considero os Blues como um abrigo sempre que a vida não corre como eu gostaria, ou simplesmente quando todos os outros músicos de todos os outros géneros musicais não me entusiasmam. Com este blog pretendo, para além de muitos outros objectivos, trocar ideias sobre este género musical.Para finalizar gostava de defender a ideia de que os Blues não acabarão, para isso menciono o livro “Genealogia da Música Popular Universalizada” de Luís Trindade, onde é escrito que “… o Blues se tornou a música do negro escravizado por excelência, como também o confidente da sua intimidade e o reflector claro da sua cultura. O Blues é o porta-voz duma classe social historicamente sugada pelo apetite económico…”. Este excerto refere-se à época da escravatura, mas à excepção da referência à cor da pele, nada me parece mais actual.
2 Comments:
porreiro
muito bom.. espero q este texto seja o primeiro de muitos...
fico a aguardar ;)
Xana
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